Skip to main content

1.1 Plenário

DIREITO ADMINISTRATIVO – REGISTRO DE IMÓVEIS; BENS PÚBLICOS; TERRAS DEVOLUTAS

DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS; FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE; POLÍTICA AGRÍCOLA E FUNDIÁRIA; REFORMA AGRÁRIA

Requisitos para a ratificação pela União de registros imobiliários decorrentes de títulos expedidos pelos estados referentes a alienações e concessões de terras públicas situadas nas faixas de fronteira – ADI 5623/DF

Resumo:

É constitucional a ratificação de registros imobiliários prevista na Lei 13.178/2015, desde que observados os requisitos e condições exigidos pela própria norma e os previstos pela Constituição Federal de 1988 concernentes à política agrícola, ao plano nacional de reforma agrária e à proteção dos bens imóveis que atendam a sua função social.

A ratificação de registro imobiliário não se confunde com a doação de terras públicas ou a desapropriação para fins de reforma agrária. Entretanto, a destinação dos imóveis, diante de sua origem pública, deve ser compatível com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária (CF/1988, art. 188), eis que asseguram o controle da efetividade do cumprimento da destinação racional aos bens.

O objetivo é impedir que a ratificação de título se converta em automática transferência de bens imóveis da União (1), até mesmo porque não seria legítimo que essa medida, permitida legalmente, pudesse ser realizada sem obediência ao conjunto das normas constitucionais que conferem efetividade ao princípio da função social da propriedade (CF/1988, arts. 5º, XXIII; 170, caput e III; e 186) (2) (3).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou parcialmente procedente a ação para atribuir interpretação conforme a Constituição aos artigos 1º, 2º e 3º da Lei 13.178/2015, fixando-se como condição para a ratificação de registros imobiliários, além dos requisitos formais previstos naquele diploma, que os respectivos imóveis rurais se submetam à política agrícola e ao plano nacional de reforma agrária previstos no art. 188 da CF/1988 e aos demais dispositivos constitucionais que protegem os bens imóveis que atendam a sua função social.

(1) CF/1988: “Art. 188. A destinação de terras públicas e devolutas será compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária. § 1º A alienação ou a concessão, a qualquer título, de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares a pessoa física ou jurídica, ainda que por interposta pessoa, dependerá de prévia aprovação do Congresso Nacional. § 2º Excetuam-se do disposto no parágrafo anterior as alienações ou as concessões de terras públicas para fins de reforma agrária.”

(2) Precedentes citado: ADI 2213 MC.

(3) CF/1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) XXIII – a propriedade atenderá a sua função social; (…)Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (…) III – função social da propriedade; (…) Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I – aproveitamento racional e adequado; II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.”

ADI 5623/DF, relatora Ministra Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 25.11.2022 (sexta-feira), às 23:59

DIREITO CONSTITUCIONAL – MINISTÉRIO PÚBLICO; PRERROGATIVAS; DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Prerrogativa do Ministério Público de posicionar-se ao lado do magistrado nos julgamentos – ADI 4768/DF

Resumo:

A prerrogativa atribuída aos membros do Ministério Público de situar-se no mesmo plano e imediatamente à direita dos magistrados nas audiências e sessões de julgamento (Lei Complementar 75/1993, art. 18, I, “a”; e Lei 8.625/1993, art. 41, XI) não fere os princípios da isonomia, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório (CF/1988, art. 5º, I, LIV e LV) nem compromete a necessária paridade de armas que deve existir entre a defesa e a acusação.

A atual posição dos sujeitos processuais na sala de audiências e de julgamento é justificada seja pela tradição, seja pela diferenciada função desempenhada pelo órgão ministerial como representante do povo, uma vez que atua de forma imparcial para alcançar os fins que lhe foram constitucionalmente conferidos (1).

O direito à igualdade das partes é substancial, não figurativa. Inclusive, a impessoalidade dos magistrados e dos membros do Ministério Público é assegurada pela organização legal das carreiras. Se assim não fosse, poderia ocorrer o subjetivismo nos julgamentos e a mudança de locais segundo afetos e desafetos, de modo que, ao determinar os lugares, a lei evita essa possibilidade.

Além disso, a atuação do Parquet pode conjugar, simultânea ou alternadamente, os papéis de parte processual e de custos legis, dada a singela circunstância de sua atribuição em defender o interesse público e a sociedade. Assim, não se pode afirmar que a proximidade física entre o integrante do Ministério Público e o magistrado, por si só, propicie algum tipo de influência ou comprometimento aos julgamentos.

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou improcedente a ação.

(1) CF/1988: “Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. (…) Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; IV – promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição; V – defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas; VI – expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva; VII – exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior; VIII – requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; IX – exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.”

ADI 4768/DF, relatora Ministra Cármen Lúcia, julgamento finalizado em 23.11.2022.

DIREITO CONSTITUCIONAL – REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS; TRÂNSITO E TRANSPORTE

Proibição de apreensão e retenção de motocicletas, motonetas ou ciclomotores de até 150 cilindradas por falta de pagamento do IPVA – ADI 6997/RN

Resumo:

É inconstitucional — por violar a competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte (CF/1988, art. 22, XI) e conferir tratamento diverso do previsto no Código de Trânsito Brasileiro (1) — lei estadual que proíbe a apreensão e a remoção de motocicletas, motonetas e ciclomotores de até 150 cilindradas, por autoridade de trânsito, em razão da falta de pagamento do IPVA.

Esta Corte, em várias oportunidades, declarou a inconstitucionalidade de normas estaduais análogas (2), tendo, inclusive, retirado do ordenamento jurídico, em recente julgado e pelos mesmos fundamentos ora utilizados, leis fluminenses que permitiam a circulação de veículos automotores nas vias públicas sem o regular pagamento do IPVA (3).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade formal da Lei 10.963/2021 do Estado do Rio Grande do Norte (4).

(1) CTB/1977:
“Art. 131. O Certificado de Licenciamento Anual será expedido ao veículo licenciado, vinculado ao Certificado de Registro, no modelo e especificações estabelecidos pelo CONTRAN. (…) § 2º O veículo somente será considerado licenciado estando quitados os débitos relativos a tributos, encargos e multas de trânsito e ambientais, vinculados ao veículo, independentemente da responsabilidade pelas infrações cometidas. (…)
Art. 230. Conduzir o veículo: (…) V – que não esteja registrado e devidamente licenciado; VI – com qualquer uma das placas de identificação sem condições de legibilidade e visibilidade: Infração – gravíssima; Penalidade – multa e apreensão do veículo; Medida administrativa – remoção do veículo; (…)
Art. 270. O veículo poderá ser retido nos casos expressos neste Código. (…) § 2º Não sendo possível sanar a falha no local da infração, o veículo, desde que ofereça condições de segurança para circulação, poderá ser liberado e entregue a condutor regularmente habilitado, mediante recolhimento do Certificado de Licenciamento Anual, contra apresentação de recibo, assinalando-se prazo razoável ao condutor para regularizar a situação, para o que se considerará, desde logo, notificado. (Redação dada pela Lei nº 13.160, de 2015). § 3º O Certificado de Licenciamento Anual será devolvido ao condutor no órgão ou entidade aplicadores das medidas administrativas, tão logo o veículo seja apresentado à autoridade devidamente regularizado. (…) § 6º Não efetuada a regularização no prazo a que se refere o § 2º, será feito registro de restrição administrativa no Renavam por órgão ou entidade executivo de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, que será retirada após comprovada a regularização. (Incluído pela Lei nº 13.160, de 2015). § 7º O descumprimento das obrigações estabelecidas no § 2º resultará em recolhimento do veículo ao depósito, aplicando-se, nesse caso, o disposto no art. 271. (Incluído pela Lei nº 13.160, de 2015).
Art. 271. O veículo será removido, nos casos previstos neste Código, para o depósito fixado pelo órgão ou entidade competente, com circunscrição sobre a via. § 1º A restituição do veículo removido só ocorrerá mediante prévio pagamento de multas, taxas e despesas com remoção e estada, além de outros encargos previstos na legislação específica. (Incluído pela Lei nº 13.160, de 2015). § 2º A liberação do veículo removido é condicionada ao reparo de qualquer componente ou equipamento obrigatório que não esteja em perfeito estado de funcionamento. (Incluído pela Lei nº 13.160, de 2015). § 3º Se o reparo referido no § 2º demandar providência que não possa ser tomada no depósito, a autoridade responsável pela remoção liberará o veículo para reparo, na forma transportada, mediante autorização, assinalando prazo para reapresentação. (Redação dada pela Lei nº 13.281, de 2016). § 4º Os serviços de remoção, depósito e guarda de veículo poderão ser realizados por órgão público, diretamente, ou por particular contratado por licitação pública, sendo o proprietário do veículo o responsável pelo pagamento dos custos desses serviços. (Redação dada pela Lei nº 13.281, de 2016). § 5º O proprietário ou o condutor deverá ser notificado, no ato de remoção do veículo, sobre as providências necessárias à sua restituição e sobre o disposto no art. 328, conforme regulamentação do CONTRAN. (Incluído pela Lei nº 13.160, de 2015). § 6º Caso o proprietário ou o condutor não esteja presente no momento da remoção do veículo, a autoridade de trânsito, no prazo de 10 (dez) dias contado da data da remoção, deverá expedir ao proprietário a notificação prevista no § 5º, por remessa postal ou por outro meio tecnológico hábil que assegure a sua ciência, e, caso reste frustrada, a notificação poderá ser feita por edital. (Redação dada pela Lei nº 13.281, de 2016). (…) § 9º Não caberá remoção nos casos em que a irregularidade puder ser sanada no local da infração. (Incluído pela Lei nº 13.160, de 2015)”.

(2) Precedentes citados: ADI 5283; ADI 6605 e ADI 3269.

(3) Precedente citado: ADI 5796.

(4) Lei 10.963/2021 do Estado do Rio Grande do Norte: “Art. 1º Ficam proibidas a apreensão e a remoção de motocicletas, motonetas ou ciclomotores de até 155cc (cento e cinquenta e cinco cilindradas), por autoridade de trânsito, em função da não identificação de pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA, no Estado do Rio Grande do Norte. Parágrafo único. Não se aplica o caput deste artigo quando a autoridade fiscalizadora estadual estiver de posse de mandado judicial ou identificar a ocorrência de outras hipóteses de apreensão e remoção previstas na Lei Federal nº 9.503, de 23 de dezembro de 1997 (Código de Trânsito Brasileiro – CTB). Art. 2º A autoridade administrativa estadual atenderá, a requerimento do proprietário interessado na retirada de motocicleta, motoneta ou ciclomotor de até 155cc (cento e cinquenta e cinco cilindradas) apreendidos até a data da entrada em vigor desta Lei, exclusivamente em decorrência da não identificação de pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA, a sua restituição sem ônus para o contribuinte. Art. 3º O Poder Executivo regulamentará esta Lei, no que couber. Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

ADI 6997/RN, relator Ministro Gilmar Mendes julgamento virtual finalizado em 25.11.2022 (sexta-feira), às 23:59

DIREITO ELEITORAL – ELEIÇÃO; CAMPANHA ELEITORAL; PRAZOS

DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

Prazo para o ajuizamento de representação que visa apurar condutas em desacordo com as normas eleitorais relativas a arrecadação e gastos de recursos – ADI 4532/DF

Resumo:

A fixação do prazo de 15 (quinze) dias para o ajuizamento da representação prevista no art. 30-A da Lei 9.504 /1997, com a redação dada pela Lei 12.034/2009, não compromete os valores da isonomia entre os candidatos nem afronta o sistema de proteção à lisura e à legitimidade das eleições (CF/1988, art. 14, § 9º) (1).

O estabelecimento do referido prazo decadencial se harmoniza com os princípios que regem o exercício da jurisdição eleitoral, em especial o da segurança jurídica, da celeridade e da duração razoável do processo (CF/1988, art. 5º, LXXVIII; e Lei 9.504/1997, art. 97-A), com o objetivo de proporcionar a estabilização do resultado das urnas, de modo a refletir a vontade soberana do eleitor.

Nesse contexto, os meios de impugnação e os recursos específicos da Justiça Eleitoral são taxativos e submetidos a exíguos prazos preclusivos, adequando-se a cada fase do processo eleitoral, circunstâncias justificáveis pela necessidade de estabilização das relações jurídicas, pelos resultados das eleições e pela temporalidade dos mandatos políticos.

Ademais, o intuito da norma foi suprir lacuna procedimental decorrente da ausência de sanção imediata no âmbito das prestações de contas, uma vez que a desaprovação jamais repercutiu diretamente nos diplomas ou mandatos dos candidatos eleitos e no direito à obtenção de quitação eleitoral.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente a ação para declarar a constitucionalidade da expressão “no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação”, constante do art. 30-A da Lei 9.504/1997, com a redação que lhe foi conferida pela Lei 12.034/2009 (2).

(1) CF/1988: “Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: (…) § 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.”

(2) Lei 9.504/1997: “Art. 30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral, no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos. (Redação dada pela Lei 12.034/2009)”.

ADI 4532/DF, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 25.11.2022 (sexta-feira) às 23:59

DIREITO TRIBUTÁRIO – CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS; PIS/PASEP; COFINS

DIREITO CONSTITUCIONAL – ORDEM SOCIAL; SEGURIDADE SOCIAL

Regime não cumulativo da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins – RE 841979/PE (Tema 756 RG)

Teses fixadas:

“I. O legislador ordinário possui autonomia para disciplinar a não cumulatividade a que se refere o art. 195, § 12, da CF/1988, respeitados os demais preceitos constitucionais, como a matriz constitucional das contribuições ao PIS e Cofins e os princípios da razoabilidade, da isonomia, da livre concorrência e da proteção à confiança; II. É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a discussão sobre a expressão ‘insumo’ presente no art. 3º, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 e sobre a compatibilidade, com essas leis, das IN/SRF 247/2002 (considerada a atualização pela IN/SRF 358/2003) e 404/2004; III. É constitucional o § 3º do art. 31 da Lei 10.865/2004.”

Resumo:

O § 12 do art. 195 da CF/1988 (1) autoriza a coexistência dos regimes cumulativo e não cumulativos da contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), contudo, ao exercer essa opção e ao disciplinar o regime não cumulativo, o legislador deve ser coerente e racional, observando o princípio da isonomia, a fim de não gerar desequilíbrios concorrenciais e discriminações arbitrárias ou injustificadas (2).

Nesse contexto, são válidas as disposições previstas nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 que: (i) estabeleceram como se deve aproveitar o crédito decorrente, dentre outros itens, de ativos produtivos, de edificações e de benfeitorias (art. 3º, § 1º, III); e (ii) impossibilitaram o aproveitamento de créditos quanto ao valor de mão de obra paga a pessoa física e ao da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição ao PIS/Pasep ou da Cofins, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota zero, isentos ou não alcançados pela contribuição (art. 3º, § 2º, I e II).

Por outro lado, não se depreende diretamente do texto constitucional o que se deve entender pelo vocábulo “insumo” para fins da não cumulatividade da contribuição ao PIS e da Cofins, cabendo à legislação infraconstitucional dispor sobre o assunto.

A revogação total da possibilidade de crédito, sem a limitação temporal específica estabelecida no caput do art. 31 da Lei 10.865/2004, não ofende a irretroatividade tributária ou a proteção da confiança. Já a proibição contida no § 3º desse dispositivo legal vale para todos os contribuintes inseridos no regime não cumulativo das contribuições, respeitou a anterioridade nonagesimal e está dentro do poder de conformação do legislador (3) (4).

Ademais, quando do início da produção dos efeitos desse dispositivo, os contribuintes só possuíam direito adquirido a crédito da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins em relação ao valor dos aluguéis ou das contraprestações de arrendamento mercantil concernentes aos meses decorridos até a véspera daquela data. De qualquer forma, inexiste direito adquirido a regime jurídico, inclusive em sede de matéria tributária.

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 756 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário.

(1) CF/1988: “Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: (…) b) a receita ou o faturamento; (…) § 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do caput, serão não-cumulativas.”

(2) Precedentes citados: RE 607642 (Tema 337 RG); RE 570122 (Tema 34 RG); RE 587108 (Tema 179 RG); RE 1178310 (Tema 1047 RG); RE 1043313 (Tema 939 RG); RE 599316 (Tema 244 RG) e RE 607109 (Tema 304 RG).

(3) Lei 10.865/2004: “Art. 31. É vedado, a partir do último dia do terceiro mês subseqüente ao da publicação desta Lei, o desconto de créditos apurados na forma do inciso III do § 1º do art. 3º das Leis 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003, relativos à depreciação ou amortização de bens e direitos de ativos imobilizados adquiridos até 30 de abril de 2004. (…) § 3º É também vedado, a partir da data a que se refere o caput, o crédito relativo a aluguel e contraprestação de arrendamento mercantil de bens que já tenham integrado o patrimônio da pessoa jurídica.”

(4) Precedentes citados: ADI 3184; RE 354870 AgR; RE 634573 AgR e RE 1043313 (Tema 939 RG).

RE 841979/PE, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 25.11.2022 (sexta-feira), às 23:59

1.2 Segunda Turma

DIREITO CONSTITUCIONAL – REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS; DIREITO ECONÔMICO; FAMÍLIA, CRIANÇA, ADOLESCENTE, JOVEM E IDOSO

Gratuidade de acesso às salas de cinemas para idosos – ARE 1307028/SP

Resumo:

É inconstitucional — por tratar de matéria que diz respeito a norma de direito econômico e contrariar a disciplina conferida a benefício já previsto no art. 23 da Lei federal 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) — lei municipal que institui o acesso gratuito de idosos às salas de cinema da cidade, de segunda a sexta-feira.

Esta Corte, nas oportunidades em que analisou a constitucionalidade de leis estaduais que concediam o direito à meia-entrada em estabelecimentos de diversão, esporte, cultura e lazer, assentou que a competência para legislar sobre direito econômico é concorrente entre a União, os estados-membros e o Distrito Federal, e que, inexistindo legislação federal a dispor sobre o tema, o ente federado pode se utilizar de sua competência plena (1) (2).

Por sua vez, o poder legislativo municipal possui competência para suplementar a legislação federal e estadual no que couber (CF/1988, art. 30, II). Contudo, é necessário que haja algum elemento de localidade afeto à disciplina legislativa, o que não se vê no caso analisado.

Nesse contexto, vislumbra-se que o legislador municipal, ao editar a Lei 2.068/2019, dispôs sobre matéria já prevista na Lei federal 10.741/2003 (3), não de forma a complementá-la, mas de substituí-la.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma, por maioria, deu provimento ao agravo regimental para determinar a reforma da decisão agravada e a manutenção do acórdão proferido pelo TJ/SP, objeto do recurso extraordinário, que havia declarado a inconstitucionalidade da Lei 2.068/2019 do Município de Cotia/SP (4).

(1) CF/1988: “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (…) I – direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico (…) § 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. § 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. § 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. § 4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.”

(2) Precedentes citados: ADI 1950; ADI 3512 e ADI 2163.

(3) Lei 10.471/2003: “Art. 23. A participação das pessoas idosas em atividades culturais e de lazer será proporcionada mediante descontos de pelo menos 50% (cinquenta por cento) nos ingressos para eventos artísticos, culturais, esportivos e de lazer, bem como o acesso preferencial aos respectivos locais. (Redação dada pela Lei nº 14.423, de 2022)”

(4) Lei 2.068/2019 do Município de Cotia/SP: “Art. 1º As empresas de exibição cinematográfica com salas de cinemas no Município de Cotia, ficam obrigadas a garantir o acesso de pessoas idosas a partir de 60 (sessenta) anos, as suas dependências sem a cobrança de importância a qualquer título ou justificativa. Art. 2º Fica garantido a pessoas idosas, a partir de 60 (sessenta) anos, o ingresso gratuito a todas as salas de exibição cinematográfica existentes no Município de Cotia, a presente propositura tem a finalidade precípua de conceder o acesso amplo a cultura ao idoso da nossa cidade conforme os preceitos normativos da Constituição Federal. Art. 3º A gratuidade de acesso a que se refere o artigo 2º da presente Lei será exercida no período de segunda-feira a sexta-feira, em qualquer sala de exibição, em qualquer sessão que nela ingressarão mediante a simples apresentação de documento de identidade com foto legalmente reconhecido. Art. 4º [sic] descumprimento da presente Lei, implicará nas seguintes penalidades: I – Multa de R$ 1.000,00 (mil) reais corrigidos semestralmente pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) ou qualquer outro que venha substituí-lo; II – O triplo em caso de reincidência; III – Suspensão das atividades por até 180 (cento e oitenta) dias; IV – Cassação do Alvará de funcionamento. Art. 5º A fiscalização da presente Lei ficará a cargo do Conselho Municipal do Idoso e do Poder Executivo. Art. 6º As empresas de exibição cinematográfica, com salas de cinema no Município de Cotia, ficam obrigadas a anexar de maneira visível um cartaz, ao lado da bilheteria, contendo as informações sobre o direito ao acesso gratuito para as pessoas com 60 anos ou mais. § 1º cartaz deve conter no mínimo 30 centímetros de altura e 40 centímetros de largura, devendo ser impresso em letras visíveis. Art. 7º Fica autorizado o recolhimento integral das importâncias arrecadadas em favor do Fundo Municipal do Idoso. Art. 8º Poder Executivo regulamentará a presente Lei, no que couber, no prazo de 30 (trinta) dias a contar da data de sua publicação. Art. 9º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.”

ARE 1307028/SP, relator Ministro Edson Fachin, redator do acórdão Ministro Gilmar Mendes, julgado em 22.11.2022

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo nº 1077/2022. Disponível em <https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/informativoSTF/anexo/Informativo_PDF/Informativo_stf_1077.pdf>

Leave a Reply