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DIREITO ADMINISTRATIVO – REGISTRO E PORTE DE ARMA DE FOGO

DIREITO CONSTITUCIONAL – HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL

Flexibilização da aquisição de armas de fogo por meio de decreto presidencial – ADI 6119/DF, ADI 6139/DF e ADI 6466/DF

Resumo:

A flexibilização, via decreto presidencial, dos critérios e requisitos para a aquisição de armas de fogo prejudica a fiscalização do Poder Público, além de violar a competência legislativa em sentido estrito para a normatização das hipóteses legais quanto à sua efetiva necessidade.

Do exame do ordenamento jurídico-constitucional brasileiro, já consideradas as incorporações provenientes do direito internacional sobre direitos humanos, é possível concluir que (a) o direito à vida e à segurança geram o dever positivo do Estado ser o agente primário na construção de uma política pública de segurança e controle da violência armada; (b) não existe direito fundamental de possuir armas de fogo no Brasil; (c) ainda que a Constituição Federal não proíba universalmente a aquisição e o porte de armas de fogo, ela exige que sempre ocorram em caráter excepcional, devidamente justificado por uma particular necessidade; (d) o dever de diligência estatal o obriga a conceber e implementar mecanismos institucionais e regulatórios apropriados para o controle do acesso a armas de fogo, como procedimentos fiscalizatórios de licenciamento, de registro, de monitoramento periódico e de exigência de treinamentos compulsórios; e (e) qualquer política pública que envolva acesso a armas de fogo deve observar os requisitos da necessidade, da adequação e da proporcionalidade.

Nesse contexto, não cabe ao Poder Executivo, no exercício de sua atividade regulamentar, criar presunções de efetiva necessidade para a aquisição de uma arma de fogo distintas das hipóteses já disciplinadas em lei, visto se tratar de requisito cuja demonstração fática é indispensável, mostrando-se impertinente estabelecer a inversão do ônus probatório quanto à veracidade das informações constantes na declaração de seu preenchimento (1).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, em apreciação conjunta, referendou (i) a decisão que: (i.1) concedeu com efeitos ex nunc a medida cautelar para suspender a eficácia do art. 12, § 1º e § 7º, IV, do Decreto 5.123/2004 (com alteração dada pelo Decreto 9.685/2019); do art. 9º, § 1º, do Decreto 9.785/2019; e do art. 3º, § 1º, do Decreto 9.845/2019; e (i.2) concedeu a cautelar para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 4º do Estatuto do Desarmamento; ao inciso I do art. 9º do Decreto 9.785/2019; e ao inciso I do art. 3º do Decreto 9.845/2019, fixando a orientação hermenêutica de que a posse de armas de fogo só pode ser autorizada às pessoas que demonstrem concretamente, por razões profissionais ou pessoais, possuírem efetiva necessidade; (ii) a decisão que concedeu, com efeitos ex nunc, a medida cautelar para: (ii.1) dar interpretação conforme a Constituição ao art. 4º, § 2º, da Lei 10.826/2003, para se fixar a tese de que a limitação dos quantitativos de munições adquiríveis se vincula àquilo que, de forma diligente e proporcional, garanta apenas o necessário à segurança dos cidadãos; (ii.2) dar interpretação conforme a Constituição ao art. 10, § 1º, I, da Lei 10.826/2003, para fixar a tese hermenêutica de que a atividade regulamentar do Poder Executivo não pode criar presunções de efetiva necessidade outras que aquelas já disciplinadas em lei; (ii.3) dar interpretação conforme a Constituição ao art. 27 da Lei 10.826/2003, a fim de fixar a tese hermenêutica de que aquisição de armas de fogo de uso restrito só pode ser autorizada no interesse da própria segurança pública ou da defesa nacional, não em razão do interesse pessoal do requerente; e (ii.4) suspender a eficácia do art. 3º, II, a, b e c do Decreto 9.846/2019; e (iii) a decisão que concedeu, com efeitos ex nunc, a medida cautelar para: (iii.1) dar interpretação conforme a Constituição ao art. 4º, § 2º, da Lei 10.826/2003; ao art. 2º, § 2º, do Decreto 9.845/2019; e ao art. 2º, § 3º, do Decreto 9.847/2019, fixando a tese de que os limites quantitativos de munições adquiríveis se limitam àquilo que, de forma diligente e proporcional, garanta apenas o necessário à segurança dos cidadãos; e (iii.2) suspender a eficácia da Portaria Interministerial 1.634/2020-GM-MD.

(1) Lei 10.826/2003: “Art. 4º Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: I – comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; II – apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa; III – comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei. § 1º O Sinarm expedirá autorização de compra de arma de fogo após atendidos os requisitos anteriormente estabelecidos, em nome do requerente e para a arma indicada, sendo intransferível esta autorização. § 2º A aquisição de munição somente poderá ser feita no calibre correspondente à arma registrada e na quantidade estabelecida no regulamento desta Lei. § 3º A empresa que comercializar arma de fogo em território nacional é obrigada a comunicar a venda à autoridade competente, como também a manter banco de dados com todas as características da arma e cópia dos documentos previstos neste artigo. § 4º A empresa que comercializa armas de fogo, acessórios e munições responde legalmente por essas mercadorias, ficando registradas como de sua propriedade enquanto não forem vendidas. § 5º A comercialização de armas de fogo, acessórios e munições entre pessoas físicas somente será efetivada mediante autorização do Sinarm. § 6º A expedição da autorização a que se refere o § 1o será concedida, ou recusada com a devida fundamentação, no prazo de 30 (trinta) dias úteis, a contar da data do requerimento do interessado. § 7º O registro precário a que se refere o § 4º prescinde do cumprimento dos requisitos dos incisos I, II e III deste artigo. § 8º Estará dispensado das exigências constantes do inciso III do caput deste artigo, na forma do regulamento, o interessado em adquirir arma de fogo de uso permitido que comprove estar autorizado a portar arma com as mesmas características daquela a ser adquirida. (…) Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm. § 1º A autorização prevista neste artigo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente: I – demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física; II – atender às exigências previstas no art. 4º desta Lei; III – apresentar documentação de propriedade de arma de fogo, bem como o seu devido registro no órgão competente. § 2º A autorização de porte de arma de fogo, prevista neste artigo, perderá automaticamente sua eficácia caso o portador dela seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de substâncias químicas ou alucinógenas. (…) Art. 27. Caberá ao Comando do Exército autorizar, excepcionalmente, a aquisição de armas de fogo de uso restrito. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às aquisições dos Comandos Militares.”

ADI 6119 MC-Ref/DF, relator Min. Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 20.9.2022 (terça-feira), às 23:59

ADI 6139 MC-Ref/DF, relator Min. Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 20.9.2022 (terça-feira), às 23:59

ADI 6466 MC-Ref/DF, relator Min. Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 20.9.2022 (terça-feira), às 23:59

DIREITO CONSTITUCIONAL – ORDEM SOCIAL; EDUCAÇÃO BÁSICA

Educação infantil: dever estatal de garantir o atendimento em creche e pré-escola às crianças de até cinco anos de idade – RE 1008166/SC (Tema 548 RG)

Tese fixada:

“1. A educação básica em todas as suas fases — educação infantil, ensino fundamental e ensino médio — constitui direito fundamental de todas as crianças e jovens, assegurado por normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade direta e imediata. 2. A educação infantil compreende creche (de zero a 3 anos) e a pré-escola (de 4 a 5 anos). Sua oferta pelo Poder Público pode ser exigida individualmente, como no caso examinado neste processo. 3. O Poder Público tem o dever jurídico de dar efetividade integral às normas constitucionais sobre acesso à educação básica.”

Resumo

O Estado tem o dever constitucional de assegurar às crianças entre zero e cinco anos de idade o atendimento em creche e pré-escola.

A educação infantil é direito subjetivo assegurado no próprio texto constitucional, mediante norma de aplicabilidade direta e eficácia plena, isto é, sem a necessidade de regulamentação pelo Poder Legislativo. Nesse contexto, os entes municipais, por meio de políticas públicas eficientes, são primariamente responsáveis por proporcionar sua concretização (1).

A educação básica representa prerrogativa constitucional deferida a todos, notadamente às crianças, e seu adimplemento impõe a satisfação de um dever de prestação positiva pelo Poder Público, consistente na garantia de acesso pleno ao sistema educacional, inclusive ao atendimento em creches e pré-escolas. Com efeito, a universalização desse acesso tem potencial de contribuir substancialmente para a redução de desigualdades sociais e raciais.

Ademais, a jurisprudência desta Corte firmou-se pela possibilidade de se exigir judicialmente do Estado uma determinada prestação material com o objetivo de concretizar um direito fundamental (2).

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 548 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário, confirmando o acórdão recorrido, para assentar o dever de a municipalidade efetuar a matrícula de uma criança em estabelecimento de educação infantil próximo de sua residência.

(1) “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…) XXV–- assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; (…) Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (…) Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: (…) IV – educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; (…) Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. (…) § 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. (…) Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

(2) Precedentes citados: ARE 639337 AgR; AI 592075 AgR e RE 592937 AgR.

RE 1008166/SC, relator Min. Luiz Fux, julgamento finalizado em 22.9.2022

DIREITO CONSTITUCIONAL – ORDEM SOCIAL; EDUCAÇÃO; VAGAS

Reserva de vagas para irmãos na mesma escola – ADI 7149/RJ

Resumo:

É constitucional lei estadual, de iniciativa parlamentar, que determina a reserva de vagas, no mesmo estabelecimento de ensino, para irmãos que frequentem a mesma etapa ou ciclo escolar, pois disciplina medida que visa consolidar políticas públicas de acesso ao sistema educacional e do maior convívio familiar possível.

De acordo com a jurisprudência desta Corte (1), não viola a competência reservada ao chefe do Poder Executivo lei de iniciativa parlamentar que reafirma ou densifica o conteúdo de direitos fundamentais previstos na própria Constituição Federal e cujo conteúdo é de observância obrigatória pelos estados-membros (CF/1988, art. 61, § 1º, II, e; e art. 84, VI, a).

Na espécie, a norma impugnada não cria despesa para a Administração Pública estadual, bem como não trata da sua estrutura ou da atribuição ou funcionamento de seus órgãos, tampouco do regime jurídico de servidores públicos, razão pela qual não há vício de inconstitucionalidade formal. Além de facilitar o acesso ao sistema de ensino, a medida diminui a evasão escolar, fortalece a convivência familiar e facilita o transporte de alunos, de modo a consolidar o direito fundamental à educação e a proteção aos interesses das crianças e dos adolescentes, em reforço ao que já dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente (2).

Com base nesse entendimento, o Tribunal, por unanimidade, julgou improcedente a ação para assentar a constitucionalidade da Lei 9.385/2021 do Estado do Rio de Janeiro (3).

(1) Precedentes citados: ADI 4723; ADI 5243 e RE 1282228 AgR.

(2) Lei 8.069/1990: “Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: (…) V – acesso à escola pública e gratuita, próxima de sua residência, garantindo-se vagas no mesmo estabelecimento a irmãos que frequentem a mesma etapa ou ciclo de ensino da educação básica.”

(3) Lei 9.385/2021 do Estado do Rio de Janeiro: “Art. 1º Esta Lei altera a Lei nº 4.528, de 28 de março de 2005, para dispor sobre a garantia de matrícula a irmãos, na mesma escola, na forma que menciona. Art. 2º O Art. 19, da Lei nº 4.528, de 28 de março de 2005, passa a vigorar acrescido do Inciso XII, que terá a seguinte redação: ‘Art. 19. […] XII – o Poder Executivo, mediante regulamentação própria , deverá garantir , a irmãos que frequentem a mesma etapa ou ciclo escolar, reserva de vagas no estabelecimento de ensino mais próximo de sua residência , desde que a Unidade Escolar onde um dos irmãos já esteja matriculado, possua a etapa ou ciclo escolar do outro irmão, e não tenha como meio de admissão processo seletivo específico, por meio de sorteio público ou prova.’ Art. 3º As dotações orçamentárias contemplarão as despesas previstas nesta Lei, devendo ser suplementadas, caso necessário. Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

ADI 7149/RJ, relator Min. Ricardo Lewandowski, julgamento virtual finalizado em 23.9.2022 (sexta-feira), às 23:59

DIREITO CONSTITUCIONAL – PODER JUDICIÁRIO; ESTATUTO DA MAGISTRATURA

Tempo de serviço como critério de desempate para a promoção na carreira da magistratura – ADI 6772/AL

Resumo:

É inconstitucional, por disciplinar matéria concernente ao Estatuto da Magistratura, norma estadual que prevê a adoção do maior tempo de serviço público como critério de desempate para a promoção de magistrados.

Compete à União, mediante lei complementar de iniciativa reservada ao Supremo Tribunal Federal, legislar sobre a organização da magistratura nacional (CF/1988, art. 93, caput). Enquanto esta norma não é editada, a uniformização do regime jurídico da magistratura permanece sob a regência da Lei Complementar 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura – LOMAN).

Portanto, as disposições e regras nela previstas devem ser seguidas por todos os legisladores estaduais e do Distrito Federal, sob pena de incidirem em inconstitucionalidade formal (1), de modo que o tempo de serviço público — como previsto na norma estadual impugnada — representa critério estranho aos fixados pela LOMAN (2).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, conheceu em parte da ação e, nessa extensão, a julgou procedente para declarar a inconstitucionalidade da expressão “aquele que tiver maior tempo de serviço público, ou, sucessivamente”, do art. 174, e o inciso IV do § 3º do art. 175, ambos da Lei 6.564/2005 do Estado de Alagoas (3).

(1) Precedentes citados: ADI 4462; ADI 6781; ADI 6779; ADI 4042; ADI 6771, ADI 189 e ADI 3358.

(2) LOMAN: “Art. 80 – A lei regulará o processo de promoção, prescrevendo a observância dos critérios ele antiguidade e de merecimento, alternadamente, e o da indicação dos candidatos à promoção por merecimento, em lista tríplice, sempre que possível. § 1º – Na Justiça dos Estados: I – apurar-se-ão na entrância a antiguidade e o merecimento, este em lista tríplice, sendo obrigatória a promoção do Juiz que figurar pela quinta vez consecutiva em lista de merecimento; havendo empate na antiguidade, terá precedência o Juiz mais antigo na carreira;”

(3) Lei 6.564/2005 do Estado de Alagoas: “Art. 174. Verificado empate, na apuração da antiguidade, dar-se-á a precedência ao magistrado mais antigo na carreira. Permanecendo o impasse, promover-se-á aquele que tiver maior tempo de serviço público, ou, sucessivamente, o mais idoso. Art. 175. A promoção por merecimento pressupõe dois anos de efetivo exercício na entrância, bem como integrar o magistrado a primeira quinta parte da lista de antiguidade a esta correspondente, salvo se não houver, preenchendo tais requisitos, quem aceite o lugar vago. (…) § 3º Havendo empate na promoção por merecimento entre mais de um juiz, adotará o tribunal o critério de desempate na seguinte forma: (…) IV – o de mais tempo de serviço público;”

ADI 6772/AL, relator Min. Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 23.9.2022 (sexta-feira), às 23:59

DIREITO CONSTITUCIONAL – REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS; MATERIAL BÉLICO

Porte de armas de fogo: presunção do risco da atividade e efetiva necessidade mediante lei estadual – ADI 7188/AC e ADI 7189/AM

Resumo:

É inconstitucional, por violar competência da União para legislar sobre materiais bélicos, norma estadual que reconhece o risco da atividade e a efetiva necessidade do porte de arma de fogo ao atirador desportivo integrante de entidades de desporto legalmente constituídas e ao vigilante de empresa de segurança privada.

A jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que, com o objetivo de garantir a uniformidade na regulamentação do tema em todo o território nacional, a definição dos requisitos para a concessão do porte de arma de fogo e dos possíveis titulares desse direito é de competência da União (1) (2).

No caso, as leis estaduais impugnadas — ao presumirem o risco das atividades e a necessidade do porte de armas de fogo para as pessoas acima referidas — suprimiram requisito estabelecido pela legislação federal, segundo a qual o exame para a concessão da respectiva autorização cabe à Polícia Federal (3). Ademais, inexiste lei complementar da União autorizando os estados-membros a legislarem sobre questões específicas acerca da matéria.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, em apreciação conjunta, converteu as medidas cautelares em julgamento de mérito e julgou procedentes as ações para declarar a inconstitucionalidade da Leis 3.941/2022 e 3.942/2022, ambas do Estado do Acre (4), e da Lei 5.835/2022 do Estado do Amazonas (5).

(1) CF/1988: “Art. 21. Compete à União: (…) VI – autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de material bélico; (…) Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (…) XXI – normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação, mobilização, inatividades e pensões das polícias militares e dos corpos de bombeiros militares;”

(2) Precedentes citados: ADI 4962; ADI 5010; ADI 4991; ADI 6982; ADI 6985; ADI 2729 e ADI 6978.

(3) Lei 10.826/2003: “Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm. § 1º A autorização prevista neste artigo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente: I – demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física; II – atender às exigências previstas no art. 4º desta Lei; III – apresentar documentação de propriedade de arma de fogo, bem como o seu devido registro no órgão competente.”

(4) Lei 3.941/2022 do Estado do Acre: “Art. 1º Esta lei reconhece, no Estado, o risco da atividade e a efetiva necessidade do porte de armas de fogo ao atirador desportivo, integrante de entidades de desporto legalmente constituídas nos termos do inciso IX, do art. 6º, da Lei Federal nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003. Art. 2º O Poder Executivo, dentro do prazo de noventa dias, regulamentará a presente lei e estabelecerá os critérios para sua implementação e cumprimento. Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação”.
Lei 3.942/2022 do Estado do Acre: “Art. 1º Esta lei reconhece o risco da atividade e a efetiva necessidade do porte de armas de fogo aos vigilantes de empresa de segurança privada do Estado. Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação”.

(5) Lei 5.835/2022 do Estado do Amazonas: “Art. 1º Fica reconhecido, no âmbito do Estado do Amazonas, o risco da atividade e a efetiva necessidade do porte de armas de fogo ao atirador desportivo integrante de entidades de desporto legalmente constituídas nos termos do inciso IX, do artigo 6º, da Lei Federal n. 10.826, de 22 de dezembro de 2003. Art. 2º O Poder Executivo, dentro do prazo de 90 dias, regulamentará a presente Lei e estabelecerá os critérios para sua implementação e cumprimento. Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação”.

ADI 7188/AC, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 23.9.2022 (sexta-feira), às 23:59

ADI 7189/AC, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 23.9.2022 (sexta-feira), às 23:59

DIREITO FINANCEIRO – AUTONOMIA ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA

DIREITO CONSTITUCIONAL – MINISTÉRIO PÚBLICO

Lei de Diretrizes Orçamentárias: autonomia do Ministério Público estadual – ADI 7073/CE

Tese fixada:

“É inconstitucional a limitação de despesas da folha complementar do Ministério Público Estadual do Estado do Ceará em percentual da despesa anual da folha normal de pagamento, sem a devida participação efetiva do órgão financeiramente autônomo no ato de estipulação em conjunto dessa limitação na Lei de Diretrizes Orçamentárias.”

Resumo:

É indispensável a efetiva participação do Ministério Público — órgão constitucionalmente autônomo — no ciclo orçamentário, sob pena da respectiva norma incidir em inconstitucionalidade por afronta à sistemática orçamentária e financeira prevista na Constituição Federal (art. 127, §§ 3º a 6º, e art. 168, caput) (1).

Com efeito, essa Corte já firmou entendimento no sentido de que a garantia atribuída ao Poder Judiciário, de ser consultado no momento da elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias, aplica-se extensivamente ao Ministério Público (2).

Com base nesse entendimento, o Tribunal, por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da expressão “no Ministério Público Estadual”, contida no art. 74, § 5º, da Lei 17.573/2021, do Estado do Ceará (3).

(1) CF/1988: “Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. (…) § 3º O Ministério Público elaborará sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias. § 4º Se o Ministério Público não encaminhar a respectiva proposta orçamentária dentro do prazo estabelecido na lei de diretrizes orçamentárias, o Poder Executivo considerará, para fins de consolidação da proposta orçamentária anual, os valores aprovados na lei orçamentária vigente, ajustados de acordo com os limites estipulados na forma do § 3º. § 5º Se a proposta orçamentária de que trata este artigo for encaminhada em desacordo com os limites estipulados na forma do § 3º, o Poder Executivo procederá aos ajustes necessários para fins de consolidação da proposta orçamentária anual. § 6º Durante a execução orçamentária do exercício, não poderá haver a realização de despesas ou a assunção de obrigações que extrapolem os limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, exceto se previamente autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais. (…) Art. 168. Os recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, ser-lhes-ão entregues até o dia 20 de cada mês, em duodécimos, na forma da lei complementar a que se refere o art. 165, § 9º.”

(2) Precedente citado: ADI 6594.

(3) Lei 17.573/2021 do Estado do Ceará: “Art. 74. Para efeito da elaboração e execução da despesa de pessoal, os Poderes e órgãos consignarão dotações específicas, distinguindo pagamento da folha normal e pagamento da folha complementar. (…) § 5º As despesas da folha complementar do exercício de 2022 não poderão exceder a 1% (um por cento) da despesa anual da folha normal de pagamento de pessoal projetada para o exercício de 2022, em cada um dos Poderes, Executivo, Legislativo, compreendendo o Tribunal de Contas do Estado, e Judiciário, no Ministério Público Estadual e na Defensoria Pública, ressalvados o caso previsto no inciso I do § 3º deste artigo e os definidos em lei específica.”

ADI 7073/CE, relator Min. André Mendonça, julgamento virtual finalizado em 23.9.2022 (sexta-feira), às 23:59

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo nº 1067/2022. Disponível em <https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/informativoSTF/anexo/Informativo_PDF/Informativo_stf_1069.pdf>

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