1.1 Plenário
DIREITO CONSTITUCIONAL – REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS; DIREITO CIVIL; POLÍTICA DE SEGUROS
DIREITO DA SAÚDE – SAÚDE SUPLEMENTAR; PLANO DE SAÚDE
Lei estadual: planos de saúde e limitação de tratamento para pessoas com deficiência – ADI 7172/RJ
Resumo:
É inconstitucional, por ofensa à competência privativa da União para legislar sobre direito civil e política de seguros (CF/1988, art. 22, I e VII), lei estadual que veda, no âmbito de seu território, operadoras de plano de saúde de limitarem consultas e sessões para o tratamento de pessoas com deficiência.
As obrigações referentes a serviços de assistência médico-hospitalar são regidas por contratos de natureza privada, razão pela qual são matérias atinentes ao direito civil e à política de seguros (1).
Consoante a Lei federal 9.656/1998 (Lei dos Planos de Saúde) — a que estão sujeitas as operadoras de planos de saúde — o serviço de saúde prestado pela iniciativa privada subordina-se às normas e à fiscalização da Agência Nacional de Saúde (ANS).
Ademais, a competência legislativa concorrente em matéria de defesa do consumidor não autoriza os estados-membros a editarem normas sobre o tema, nem mesmo em caráter suplementar (2).
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, converteu a apreciação da medida cautelar em julgamento de mérito e julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade formal da Lei 9.438/2021 do Estado do Rio de Janeiro (3).
(1) Precedentes citados: ADI 7029; ADI 6441; ADI 6493; ADI 6452; ADI 4818; ADI 3402 e ADI 3207.
(2) Precedentes citados: ADI 5173 e ADI 4701.
(3) Lei 9.438/2021 do Estado do Rio de Janeiro: “Art. 1º É vedado aos planos de saúde de limitar consultas e sessões de fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e psicoterapia no tratamento das pessoas com transtorno do espectro autista (TEA), deficiência física, intelectual, mental, auditiva, visual e altas habilidades/superdotação no Estado do Rio de Janeiro. Art. 2º O descumprimento das disposições desta lei sujeitará na aplicação de multa ao infrator no valor de 20.000 (vinte mil) UFIR-RJ, devendo ser revertida para o Fundo do Conselho Estadual de Integração das Pessoas com Deficiência – CEPDE. Art. 3º Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.”
ADI 7172/RJ, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 17.10.2022 (segunda-feira), às 23:59
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – BLOQUEIO DE VALORES; PENHORA
DIREITO CONSTITUCIONAL – ORÇAMENTO
Satisfação de créditos trabalhistas mediante bloqueio de recursos públicos repassados pelo FNDE – ADPF 988/SC
Resumo:
Ofendem os princípios da legalidade orçamentária, da separação dos Poderes e da continuidade da prestação dos serviços públicos as decisões judiciais que, com o objetivo de satisfazer créditos trabalhistas, determinam o bloqueio de recursos públicos federais transferidos às Associações de Pais e Professores (APPs) pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para a implementação do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE).
O montante atribuído às APPs destina-se ao cumprimento de atividades essencialmente públicas, razão pela qual a respectiva execução dos valores deve seguir as regras constitucionais de organização orçamentária das finanças públicas (1).
Essas associações são unidades executoras próprias, e, por isso, devem empregar os recursos obtidos pelo PDDE nas finalidades legais, vedada a sua utilização para o pagamento de pessoal (2).
Ademais, os recursos públicos de aplicação compulsória em educação são impenhoráveis (3) e esta Corte afasta a possibilidade de o Poder Judiciário modificar, mediante a imposição de atos constritivos, a destinação de verbas previamente definida pelas autoridades governamentais competentes, por configurar indevida interferência nas atribuições reservadas aos demais Poderes (4).
Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ADPF para determinar a suspensão das decisões judiciais proferidas pela Justiça do Trabalho do Estado de Santa Catarina que determinaram o bloqueio, penhora ou sequestro sobre verbas repassadas pelo FNDE, referentes ao PDDE, às APPs naquele estado para satisfazer crédito trabalhista e determinar a imediata devolução das verbas bloqueadas para o atendimento dos fins a que se destinam os valores.
(1) CF/1988: “Art. 167. São vedados: (…) VI – a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa;”
(2) Precedentes citados: ADPF 484, ADPF 275, ADPF 485, ADPF 585 AgR, ADPF 387 e ADPF 664 MC-Ref.
(3) CPC/2015: “Art. 833. São impenhoráveis: (…) IX – os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;”
(4) Precedentes citados: ADPF 114 e ADPF 620.
ADPF 988/SC, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 17.10.2022 (segunda-feira), às 23:59
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – LEGITIMIDADE RECURSAL
DIREITO TRIBUTÁRIO – IMPOSTOS; ISS
Procuradorias municipais: legitimidade para interpor recurso em ação de controle de constitucionalidade – ARE 873804 AgR-segundo-ED-EDv-AgR/RJ
Resumo:
A procuradoria jurídica estadual ou municipal possui legitimidade para interpor recurso em face de acórdão de tribunal de justiça proferido em representação de inconstitucionalidade.
Em que pese existirem alguns paradigmas em sentido contrário ao da decisão ora agravada, a decisão embargada é no sentido da orientação fixada pelo Plenário desta Corte, de modo que não subsiste a alegada divergência jurisprudencial (1).
Nesse contexto, prevalece o entendimento de que a ausência de assinatura do chefe do Poder Executivo na petição recursal não constitui óbice para a análise do recurso, sendo suficiente que a peça seja subscrita pelo procurador, que também detém legitimidade recursal em ações de controle de constitucionalidade.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental.
(1) Precedentes citados: RE 570392 e RE 839950.
ARE 873804 AgR-segundo-ED-EDv-AgR/RJ, relatora Min. Cármen Lúcia, julgado em 13.10.2022
DIREITO TRIBUTÁRIO – IMPOSTOS; IPVA; FATO GERADOR; PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE
IPVA: contagem de prazos para atendimento dos princípios da anterioridade anual e nonagesimal – ADI 5282/PR
Tese fixada:
“I – No caso de um tributo sujeito duplamente à anterioridade de exercício e à noventena, a lei que institui ou majora a imposição somente será eficaz, de um lado, no exercício financeiro seguinte ao de sua publicação e, de outro, após decorridos noventa dias da data de sua divulgação em meio oficial. Logo, a contar da publicação da lei, os prazos transcorrem simultaneamente, e não sucessivamente.
II – Não há desvio de finalidade no caso de lei ordinária alterar o aspecto temporal do IPVA para viabilizar, a um só tempo, o respeito à garantia da anterioridade, inclusive nonagesimal, e viabilizar a tributação dos veículos automotores pela alíquota majorada no exercício financeiro seguinte ao da publicação desse diploma legal. Afinal, a finalidade da legislação é lícita e explícita.
III – O princípio da igualdade tributária não resta ofendido na hipótese de um veículo automotor novo submeter-se a alíquota distinta de IPVA em comparação a outro automóvel adquirido em anos anteriores no lapso referente aos 90 (noventa) dias da noventena, em certo exercício financeiro. Sendo assim, pela própria sistemática de tributação do IPVA posta na legislação infraconstitucional, não se cuida de tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente.”
Resumo:
É simultânea a contagem dos prazos das garantias fundamentais a que se referem os princípios da anterioridade anual e nonagesimal tributárias, a partir da data da publicação da lei que institui ou majora o tributo.
Com efeito, ambas as anterioridades se caracterizam como uma única norma-regra, de modo que a respectiva incidência se opera sempre por completo: tudo ou nada. Esta Corte possui precedente no sentido da contagem simultânea, e não sucessiva, dos prazos (1) (2).
Ademais, não fere o princípio da igualdade tributária a diferenciação do momento da incidência do Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor (IPVA) quando a finalidade é alcançar objetivos constitucionais, como, por exemplo, estimular a compra de veículos novos em prol do desenvolvimento e da industrialização no País ou o mercado interno como patrimônio nacional (3) (4). Também devem ser consideradas nessa análise as peculiaridades da sistemática normativa local quanto ao tratamento do tributo específico.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente a ação, assentando a constitucionalidade do art. 5º, § 1º, e do art. 6º, ambos da Lei 18.371/2014 do Estado do Paraná (5).
(1) CF/1988: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (…) II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos; III – cobrar tributos: a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado; b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;”
(2) Precedente citado: ADI 3694.
(3) CF/1988: “Art. 219. O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal. Parágrafo único. O Estado estimulará a formação e o fortalecimento da inovação nas empresas, bem como nos demais entes, públicos ou privados, a constituição e a manutenção de parques e polos tecnológicos e de demais ambientes promotores da inovação, a atuação dos inventores independentes e a criação, absorção, difusão e transferência de tecnologia.”
(4) Precedente citado: ADI 1643.
(5) Lei 18.371/2014 do Estado do Paraná: “Art. 5.º O fato gerador do imposto de que trata a Lei nº 14.260, de 2003, referente ao exercício de 2015, em relação aos veículos automotores adquiridos em anos anteriores, ocorrerá no dia 1º de abril de 2015. § 1º O IPVA de que trata o caput deste artigo terá seu vencimento em 1º de abril de 2015. § 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas transferências de veículos automotores usados para outras unidades federadas, adquiridos em exercício anterior ao de 2015, hipótese em que considerar-se-á ocorrido o fato gerador na data da transferência. Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação, produzindo efeitos a partir do 1º dia do quarto mês subsequente ao da publicação em relação ao art. 1º, ao inciso I do art. 4º e ao art. 7º.”
ADI 5282/PR, relator Min. André Mendonça, julgamento virtual finalizado em 17.10.2022 (segunda-feira), às 23:59
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo nº 1072/2022. Disponível em <https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/informativoSTF/anexo/Informativo_PDF/Informativo_stf_1072.pdf>